O chamado ‘kit covid’ ou tratamento precoce, que consiste em uma combinação de medicamentos até então apontados como ineficazes ou ainda em fase de pesquisa, vem sendo distribuído em empresas e recomendado por médicos em consultórios como forma de prevenir ou diminuir a carga viral pelo coronavírus.
O kit é composto por medicamentos como a ivermectina, azitromicina, vitamina C, zinco, Vitamina D, entre outras substâncias. No entanto, de acordo com o médico hepatologista Fábio Vosqui, que atua em Feira de Santana, ainda não existem medicamentos que comprovadamente previnem a covid-19, conforme também já foi divulgado por diversas organizações de saúde e cientistas de todo o mundo.
Segundo ele, o uso da ivermectina, por exemplo, está sendo associado ao surgimento de problemas hepáticos (fígado) em pacientes que fizeram uso dessa medicação para prevenir a covid.
Foto: Ney Silva/ Acorda Cidade
“É muito frequente a gente atender casos de alterações tóxicas e começaram a surgir casos de alterações das enzimas hepáticas em pacientes com processos inflamatórios por pessoas que se expuseram ao kit covid. Não existe recomendação e não tem nenhum trabalho que valide o uso da ivermectina na prevenção do coronavírus e também não existe nenhum trabalho que valide o seu uso no tratamento.
Conforme o especialista, a ivermectina é um antiparasitário, usado para tratar algumas infestações intestinais e algumas lesões de pele, como a escabiose. Em doses altas ou repetitivas em um curto espaço de tempo, a substância pode trazer lesões no fígado e o paciente pode necessitar até mesmo de um transplante.
“Já existem relatos pelo país de transplantes de fígado por conta das altas doses dessa medicação, e além disso, por ser um antiparasitário, ela pode modificar a microflora intestinal e isso pode causar sérias repercussões, como o surgimento de doenças funcionais do aparelho digestivo.”
Ele destacou que alguns estudos foram realizados com a ivermectina, mas todos se mostraram ineficazes.
“Houve um estudo ano passado, um trabalho feito in vitro, em laboratório, não foi em humanos, em uma dose muito mais alta do que a gente costuma utilizar no tratamento das parasitoses, para a covid, e mostrou uma redução da carga viral. Mas esse trabalho não pôde ser reproduzido em humanos devido à alta dose, que seria extremamente tóxica em humanos. Dessa forma não existe nenhum trabalho que demonstre que a ivermectina é eficaz. Outros trabalhos se sucederam com utilização de ivermectina, na tentativa de diminuir a carga viral e assim diminuir a gravidade da doença, mas todos foram falhos. Algumas metanalises, que é um conjunto de trabalhos nessa avaliação mostraram várias vezes que traziam uma baixa aplicabilidade na clínica.”
Fábio Vosqui salientou ainda que a melhor forma de se prescrever uma medicação é quando ela tem uma boa indicação. “É uma excelente medicação no tratamento de algumas parasitoses e de afecções da pele, como a escabiose, não existe nenhuma outra indicação em bula. E o próprio laboratório que fabrica a ivermectina contraindicou sua prescrição para outras patologias. Nas doses habituais, o risco é muito pequeno da ivermectina causar lesão hepática. É uma droga segura e quando ela faz alguma lesão, geralmente, são elevações dos marcadores de inflamação de leve a moderado grau. E esse processo inflamatório costuma se resolver com a parada do uso da medicação. Já em alguns casos graves o paciente pode apresentar o olho amarelado, que chamamos de icterícia, náuseas, dor abdominal e urina escura, que são casos graves. Alguns pacientes apresentam apenas alterações laboratoriais”, explicou.
O hepatologista finalizou dizendo que todo medicamento é também uma droga e vai ter uma boa ação quando tiver uma boa indicação. “Então todo medicamento tem que ser prescrito e utilizado com responsabilidade sob a orientação de um médico, um farmacêutico, enfermeira, pessoas que estão habilitadas a poder dar alguma orientação relacionada ao uso de medicações.”
Com informações do repórter Ney Silva do Acorda Cidade.
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